quarta-feira, 22 de junho de 2022

Atletas de Poços sofrem injúria racial durante Copa Derla de Handebol

Poços de Caldas, MG – Casos de injúrias raciais estão tomando conta dos noticiários com uma frequência assustadora. É comum numa partida de futebol de campeonatos, por todo o mundo, atletas negros enfrentarem situações de embaraços ao serem chamados de ‘macacos’ e ainda verem torcedores rivais imitando gestos e gritos desses animais. Quem não se lembra do caso do goleiro Aranha, que quando defendia o Santos Futebol Clube foi ofendido por uma torcedora? Indignado, ele colocou a “boca no trombone” e brigou muito até que a torcedora do triste ato fosse punida. Mas de lá pra cá nada mudou e estas ações estão cada vez mais próximas de nós. No último final de semana, aconteceu com atletas do time de handebol de Poços de Caldas que estão disputando a Copa Derla. Em jogo que aconteceu na cidade paulista de Mogi Guaçu, toda vez que atletas negras da equipe de Poços tocavam na bola ouvia-se de um pequeno grupo de torcedores gritos de ‘macaca’.

A treinadora do time, professora Elaine Ferreira, está indignada com a situação e pede providências junto à organização do campeonato. Segundo ela, é inadmissível que atos como este aconteçam nos dias de hoje. Ela contou para o Mantiqueira que pediu a transferência da partida para Mogi Guaçu em jogo diante do time da casa. Elaine relata que no primeiro jogo tudo aconteceu normalmente e o comportamento dos torcedores estava tranquilo. Poços de Caldas venceu o jogo de Mogi Guaçu por um placar tranquilo. Depois aconteceu um intervalo para as jogadoras descansarem e recuperarem a energia. Os problemas começaram no segundo jogo entre os times. Segundo a treinadora Elaine, o comportamento da torcida começou a ficar alterado no segundo tempo. “Comecei a perceber a torcida mais ofensiva, com xingamentos direcionados para nossas atletas e muitos palavrões. O que mais me deixou triste foi que ao olhar para a arquibancada uma suposta mãe de uma atleta do time de Mogi ameaçava minhas atletas que passavam pelo alambrado. Eram ameaças verbais pesadas e sinais de que poderiam partir para uma agressão física após o jogo”, conta a professora, que disse ter ficado bastante incomodada com toda a situação, mas resolveu manter seus atletas em quadra. À medida que a partida foi se aproximando do final o caso foi ficando mais grave. A professora conta que faltando dez minutos para o fim da partida as ofensas preconceituosas começaram. “Comecei a escutar gemidos da arquibancada imitando o som de macaco. Neste momento, voltei para o treinador do time da casa e perguntei se ele tinha ouvido e ele disse que não. Aí me virei para a mesa e disse que não admitiria aquela situação e me foi pedido para ter calma”, conta Elaine. A professora disse que decidiu seguir no jogo para ver se aquela situação constrangedora terminava, mas não foi o que aconteceu. “Mais torcedores começaram a imitar sons de macaco e isso toda vez que atletas meus pegavam na bola e acontecia justamente com as minhas atletas negras que estavam no lance com a posse de bola”, disse Elaine. Neste momento, ela conta que pediu para o árbitro parar com o jogo porque caso contrário retiraria o time de quadra. 

Elaine conta que ele realmente parou o jogo e escutou seus argumentos. A professora conta que o árbitro disse em primeiro momento que não tinha ouvido nada pelo fato de estar concentrado no jogo. “Mas neste exato momento aconteceram novos gritos e o árbitro foi até a arquibancada, conversou com as pessoas, alertou que o ato que estavam cometendo era crime. O grupo negou que estaria ofendendo as atletas de Poços, inclusive aquela pessoa que parecia mãe de atleta disse que nada tinha ocorrido”, conta a professora. 

Depois da intervenção do árbitro os ataques cessaram e a partida teve seu retorno. Elaine conta que as atletas que estavam sendo ofendidas foram tiradas do jogo para serem preservadas. No final do jogo a arbitragem se reuniu com as atletas e lamentou o acontecido, citou casos graves que resultaram até em mortes em outros locais e pediu para o fato não se repetir. “Minha revolta é que o time da casa não interveio. Se acontecesse em Poços eu teria parado o jogo e conversado com as pessoas. Se continuasse eu pediria para a pessoa se retirar. Estamos lidando com meninas de 12 a 16 anos, elas ficaram muito abaladas. Estou há muito no handebol e foi a primeira vez que isso aconteceu comigo. No dia seguinte até me condenei por não ter feito algo mais enérgico, um Boletim de Ocorrência, algo neste sentido, a situação me deixou em choque e a primeira coisa que eu fiz foi tentar proteger as meninas. Elas estão disputando campeonatos importantes e nunca tinha acontecido isto”, conta a professora. “Me chamou a atenção do time adversário não ter nenhuma atleta negra e no meu time tinha seis atletas negras. Lamento a situação, já que aos meus olhos todas são iguais, independentemente da cor de pele. Nunca pensei que isso pudesse ser arma para ataques, mas realmente acontece, as pessoas são tratadas por cor e as pessoas se acham superiores a uma negra. Muito triste”, finalizou a professora.

Ela relatou todos os fatos para os organizadores do campeonato e espera uma providência. Neste domingo a equipe de Poços volta a quadra e a professora Elaine conta que será feito um protesto contra o racismo. 


Resposta

A Liga Derla Jandaia foi procurada pelo Mantiqueira e enviou a seguinte nota: “Recebemos os relatórios de ambas as partes envolvidas e da arbitragem. Tudo foi enviado à comissão disciplinar para analisarem. Nós, da Liga Derla Jandaia, repudiamos quaisquer atos racistas ou preconceitos. Reforçamos que o respeito ao próximo, as diferenças raciais, culturais e etnias, são pilares desenvolvidos pela organização da competição”.


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