Tatiele Roberta de Carvalho tem apenas 20 anos mas já traçou uma bela história de vida. De origem muito humilde e revelada por seu Chico Corredor, ela está hoje entre as principais atletas do país e alça voos mais altos. O grande objetivo são os jogos olímpicos do Brasil em 2016.
Início
"Aos 10 anos comecei minha vida no esporte e este início foi sem nenhum profissionalismo, apenas por puro prazer. Na época nem passava pela minha cabeça ser atleta de corridas e meu verdadeiro sonho era ser jogadora de futebol. Queria fazer parte de uma grande equipe, no entanto, mesmo jogando bem nunca tive uma oportunidade. Na época eu tinha um primo que estava acostumado a correr nas competições em Poços de Caldas. Ele me levou para treinar atletismo. No início eu não gostei muito da ideia, mas de tanto ele insistir acabei indo treinar. Detestei, achei muito puxado. O futebol era muito melhor,você corre e para, dá uma descansadinha. No atletismo tem que correr o tempo todo, sem parar. Disse para ele que nunca mais voltaria a treinar atletismo. Fiquei afastada durante um mês, resistindo aos incentivos do meu primo que tentava me fazer voltar a treinar de qualquer maneira. Eu não ia de jeito nenhum. Passados mais alguns meses, meu primo venceu uma prova e ganhou 100 reais. Eu não ganhava nada com o futebol. Lembro direitinho quando ele disse assim: “Viu sua boba, ganhei 100 reais na Volta ao Cristo e você está perdendo tempo”. Aí coloquei na minha cabeça que eu poderia ganhar muito mais dinheiro que ele. Foi assim que comecei os primeiros treinos para valer no atletismo com o seu Chico Corredor. Levei uma bronca dele, que disse que queria uma atleta firme nos treinos e não uma menina que ia um dia e depois ficava tempos sem aparecer. Concordei com ele. Neste dia ele mandou que eu corresse por 15 minutos mas eu me empolguei e corri 27 minutos em volta do campo. Eu queria correr meia hora mas ele não deixou. Levei nova bronca. Foi assim que começou minha carreira e meu trabalho dentro do atletismo de Poços de Caldas".
Origem humildade
Nasci em Poços de Caldas, mas morei na roça durante oito anos, onde ajudava minha família a cuidar de gado. Quando completei oito anos mudamos para a cidade. Éramos uma família de seis filhos e passamos muitas dificuldades. Chegamos até mesmo ao ponto de não ter o que comer e minha mãe tinha que pedir para o vizinho para conseguir sustentar a gente. Meu pai nesta mesma época nos abandonou. O esporte, através do atletismo, me ajudou a superar essa época difícil. Meu sonho sempre foi dar uma casa para minha mãe e vejo que através do esporte esse sonho pode ser realizado. Minha infância pobre nunca me possibilitou ter nada. Meus pais não tinham condições de me dar nada. Nem mesmo uma roupa ou material de escola, que eram doados por pessoas que sentiam solidariedade por nossa situação. Mas isso tudo teve seu lado positivo e me fez buscar um futuro melhor. Quando entrei para o atletismo eu pensei que tudo isso iria mudar, tudo seria diferente, nunca mais iria passar fome, nunca mais iria passar dificuldades. Vejo minha situação hoje, o que estou conseguindo através do esporte, como a maior conquista da minha vida. Hoje não passo dificuldades. Moro com minha avó e tanto ela como minha mãe não passam mais apuros. O sonho de dar uma casa para minha mãe vai se realizar através de minhas vitórias no esporte e disso eu não tenho dúvidas."
Apoio da família
"No começo da minha iniciação esportiva minha família me apoiou muito. Até meus 17 anos eles sempre me incentivaram. Hoje a situação mudou um pouco. Eles acreditam no meu trabalho, mas não são mais aquelas pessoas presentes em minha carreira. Antes eles sempre queriam saber onde eu ia, onde eu treinava e isso não acontece hoje. Agora eu tento batalhar para conquistar a confiança deles. Eles acham que o atletismo está me matando, que estou fazendo força demais e na visão deles isso não compensa para mim. Então estou numa constante luta de colocar na cabeça deles que o atletismo é um bem maravilhoso que aconteceu na minha vida".
As primeiras provas
Logo na minha primeira competição eu fiquei em quinto lugar na categoria geral e primeira colocada na categoria acima da minha idade. Fui campeã da prova e esse dia foi maravilhoso e me motivou ainda mais a me dedicar ao esporte. Neste período venci e subi ao pódio de várias corridas amadoras. Todos os finais de ano eu ia para a São Silvestrinha. Participar desta prova era uma das minhas alegrias. Nesta época já estava com12 anos. Às vezes não conseguia uma colocação boa e ficava chateada. A premiação era apenas para as cinco primeiras e nesses momentos pensava em desistir. Mas o seu Chico sempre conversava comigo e não deixava eu desistir nunca. Aos 13 anos eu consegui ser a quinta colocada e aos 14 anos fui campeã. Na época fui vista por várias equipes, cheguei a fazer testes em clubes de São Paulo, passei mas não tive condições de ir embora, pois era muito nova. Novamente fui desanimando com a situação. No ano seguinte, aos 15 anos, fiquei em terceiro lugar mas como eu estava desmotivada não consegui um resultado melhor. Não estava também me dedicando muito aos treinamentos naquela fase de minha vida. Aos 17 anos eu estava mesmo desistindo da carreira e não queria mais saber de correr".
Profissional
"Consegui superar aquela fase difícil e aos 18 anos resolvi investir tudo no atletismo e dei início a minha carreira profissional. E graças a Deus minha vida mudou radicalmente. Consegui vários títulos e hoje posso falar e me orgulhar de estar entre as melhores atletas do país”.
Transição
“Minha transição foi muito complicada. Trabalhei oito anos com o seu Chico, que foi uma pessoa muito boa para mim, dedicou o máximo que pôde de sua vida me ajudando. Pagava minhas viagens. O primeiro tênis que tive foi ele quem me deu, tudo que precisava na minha casa ele me ajudava. Depois de oito anos ele passou meu treinamento para sua sobrinha Juliana e trabalhei com ela por seis meses até conhecer o meu atual treinador Agnaldo Alexandre. A gente se encontrou e ele viu que eu tinha potencial de crescer na carreira e começamos a trabalhar juntos. Na época expliquei tudo para o seu Chico, deixei claro que não era nada pessoal mas sim porque minha carreira precisava crescer e ele entendeu a situação e me incentivou dizendo que só queria meu bem e se trocar de treinador era o caminho que eu fosse feliz em minha escolha. Comecei um trabalho com o Agnaldo e tive que perder peso. Na época perdi 14 quilos. Foi difícil porque eu não tinha uma disciplina alimentar, comia muito e o Agnaldo mudou tudo radicalmente em minha alimentação. A adaptação foi muito complicada, eu estava acostumada à rotina tranquila de treinos e com o novo técnico tive que treinar mais e mais fortemente, em dois períodos. Hoje acordo cinco horas da manhã e já começo a treinar. Batalhei, superei o início difícil. Demorei apenas três meses para estar totalmente adaptada ao novo trabalho e logo os bons resultados começaram a aparecer. Este trabalho me proporciona buscar novos recordes. Agora em 2010 quero o índice para o Pan-Americano do México. Quero, dentro de dois anos, buscar o recorde brasileiro dos 10.000 metros que pertence a Carmem de Oliveira. Este recorde já dura alguns anos, desde 1993, e ninguém nunca chegou perto dele. Quero trabalhar muito para conseguir esse feito importante para minha carreira. Outro grande objetivo é as Olimpíadas no Brasil quando estarei no auge de minha carreira e quero estar presente."
As vitórias
“Esse ano conquistei o quarto lugar na corrida de Brasília. Esta competição reuniu todos os atletas de ponta e posso considerar o resultado como excelente. Fiquei em oitavo lugar na Tribuna, uma corrida internacional na cidade de Santos. Essa prova me colocou entre as 10 melhores atletas do país. Fui campeã da corrida da EPTV em Campinas quando derrotei a Edielza do Cruzeiro, uma atleta fantástica. Fiquei em sexto na Corrida da Pampulha. Ao longo da carreira tenho aproximadamente 40 vitórias. Destaco o feito conquistado em Santos quando fiz o meu melhor tempo nos 10.000 metros com 33 minutos e 46 centésimos. Fiquei entre as cinco melhores atletas do país neste quesito. O que me emociona muito é ver que antes eu era fã dessas atletas e hoje estou competindo com elas. Nunca imaginei que eu tivesse esse potencial e que poderia chegar onde cheguei. Fico sem conseguir definir o quanto tudo isso é importante para mim. Marizete Rezende era uma atleta que eu pedia autógrafos em todas as provas e hoje ela está ficando para trás. Espero que daqui algum tempo as pessoas cheguem em mim para pedir autógrafos também. Já comecei a dar alguns autógrafos na rua, já comecei a fazer meu pezinho de meia e estou feliz pois não imaginava que minha carreira de atleta pudesse ser tão grande como está hoje”.
Fechando a temporada
“Neste domingo vou competir em Barueri, grande São Paulo, uma prova de oito quilômetros que servirá de preparação para a São Silvestre. Quero chegar bem preparada na São Silvestre e trazer um grande resultado para Poços de Caldas. Espero ficar entre as 10 nesta prova bem mais difícil que a Volta da Pampulha quando fui a sexta colocada. A São Silvestre reúne as melhores atletas do país e ainda também as fortes quenianas. A prova tem muitas subidas e descidas e isso é um adversário a mais. Estou me preparando técnica e psicologicamente para essa última prova do ano.”
Carreira internacional
“É meu sonho competir fora do Brasil. Acredito que até final do ano que vem possa participar de algumas provas no exterior”.
Equipe
“Um atleta sem equipe não vai muito longe. Todo atleta precisa de uma estrutura muito grande atrás de si. Espero sim uma oportunidade, que apareça alguma equipe grande para me ajudar, que goste do meu trabalho. Por enquanto não tenho equipe e conto com a ajuda de alguns patrocinadores. Tenho fé que ainda vou fazer parte do quadro de atletas de uma grande equipe brasileira”
Especialidade
“Minha especialidade hoje são os 5.000 e 10.000 metros. Corro essas provas com o pensamento em bater recordes. Isso não significa que eu não posso correr sete ou oito mil metros. Chego a participar de duas competições por mês se tiver condições, caso contrário, me dedico apenas aos treinamentos para estar bem durante uma prova. Já cheguei a ficar três meses sem competir, apenas me dedicando aos treinamentos. O treinamento dá mais bagagem do que a competição. No treino você compete com você mesmo e tenta melhorar o desempenho sempre. A competição é você, o tempo e o adversário, é muito difícil. Para o atleta ser forte tem que competir apenas duas provas ao mês e se dedicar muito aos treinamentos. Se participar de três provas tem que passar pelo menos um mês sem competir. No treinamento você pode errar, ele te dá a chance de consertar esse erro. Se você não treina bem não compete bem e não adianta pensar o contrário”.
Desvantagem
“Mesmo conquistando bons resultados ainda estou em desvantagem com relação às grandes atletas do país. Hoje, enquanto eu trabalho, elas vivem inteiramente do atletismo. Eu ainda preciso do meu trabalho para viver do atletismo. É preciso um patrocinador forte, uma boa equipe que pague para você mais que você ganha no seu trabalho e por isso ainda acho que vai demorar um pouco para eu viver apenas do atletismo. É complicado treinar cedo, trabalhar o dia todo, treinar quase de noite e no outro dia começar tudo de novo. Essa é minha grande desvantagem sobre as demais atletas. A meu favor pesa o fato de eu ter apenas 20 anos enquanto elas estão com 30 anos e no auge da carreira”.
Agradecimentos
“Sempre agradeço primeiro a Deus pois superei muitas dificuldades na vida e com Deus tudo ficou mais fácil. Tenho um talento no esporte e também isso me foi oferecido por Ele. Agradeço ainda meu treinador Agnaldo que nunca deixou de acreditar em mim, ao seu Chico Corredor, que me descobriu. Ele é uma pessoa maravilhosa, nunca duvidou que eu poderia crescer no esporte e que minha carreira poderia ser fantástica. Agradeço a Joana que trabalhou comigo, aos meus patrocinadores, sr. Luiz do Doces Guigui, o Lions Clube Urânio, que é a Guarda Mirim, ao Rovilson da Supartes Auto Peças que começou a trabalhar comigo e a Sicred de São Paulo. Agradeço ainda ao Zé Luiz da Academia Fit Run e ao André Oliveira da Academia Perfomance, sempre dispostos a me ajudar.
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