terça-feira, 27 de julho de 2010

Rubinho fecha contrato com o Kuwait, mas fala em voltar para Poços de Caldas

Trabalhando fora do Brasil desde 1996, Rubio Guerra Júnior acaba de fechar contrato para trabalhar no Kuwait. Ele assinou por dois anos com o Club Al Arabi do Kwait, o maior Club daquele país. Ex-jogador da Caldense nas temporadas de 1986 a 1993, ele está em Poços de Caldas visitando familiares e conversou com a reportagem. Depois de passagens por Canadá e Qatar o treinador conquistou renome internacional, mas fala que tem vontade em voltar a trabalhar na cidade o mais rápido possível.
Mantiqueira - Como foi seu início na vida esportiva?
Rubio Guerra Jr. - Comecei no futsal com o Sr. Mané da Pinta na Caldense, clube que sempre foi minha casa. Infelizmente, com o passar do tempo, a Caldense virou um clube para poucos. Por isso fui embora da cidade. Joguei profissionalmente na Caldense por seis anos, cinco como titular do time principal. Não me considero um grande jogador. Fui um jogador mediano, porém, quando estava em campo, demonstrei muita vontade e, principalmente, amor pelo clube e sua camisa. Joguei na Caldense em uma época em que o clube não tinha dinheiro. Fazia-se futebol na raça. Hoje, o clube tem dinheiro, pode pagar bem aos jogadores, possui uma estrutura maravilhosa que antes não existia. Na época que joguei, alguns jogadores tinham que ir ao mercado municipal pedir dinheiro para um ou outro dono de barraca para comprar gás porque o clube não tinha apoio de ninguém na cidade. Viajávamos em um ônibus muito velho, com poucas condições de segurança, bancos quebrados. Mesmo assim, o atleta defendia a Caldense com o coração. Hoje, é tudo diferente. A Caldense oferece uma estrutura para o jogador de primeiro mundo. É uma estrutura que deveria colocar o time em uma série B ou C do Brasileiro. Mesmo assim, muito se ouve que hoje é difícil fazer futebol. Não compartilho desta opinião. Hoje, é muito mais fácil fazer futebol do que na minha época. Outro diferencial daquela época é que a Caldense montava seu time com 8 ou 9 jogadores de Poços de Caldas ou região. Tive o privilégio de jogar com Joaci, Casca, Renê, Ralf, Muniz, enfim, vários jogadores da cidade. Hoje, isto não acontece. O jogador da cidade não é mais interessante para a Caldense. Ele não traz "lucro" para o clube. O que vejo é que para o clube é interessante o jogador vir de longe, trabalhar e depois ir embora. Não entendo o porquê desta cultura, o porquê desta atitude do clube. Na verdade eu sei, mas são coisas que é melhor não ficar falando, mas acho que isto deveria ser revisto. A Caldense tem um conselho que participa pouco, parece que tem medo de brigar pelo futebol. A gente só ouve falar do Laércio e do Jânio. A Caldense não é só os dois. Vejo comentários de que o Vulcão vai morrer, vai parar, mas talvez um dia o Vulcão passe a Caldense. Querendo ou não o Vulcão é mais aberto, tem torcida. Andaram fazendo algumas bobagens ao meu modo de ver, deram o passo maior que a perna, mas ainda pode-se arrumar isto. Criaram uma rivalidade na cidade como se fossem um Corinthians e Palmeiras. Não precisa ser assim. Poços de Caldas tem tamanho suficiente para ter dois times e estes times precisam viver em comum acordo, tem que viver em paz. Com os dois clubes em paz o torcedor também acaba entrando no clima. Não precisa existir rivalidade nas arquibancadas. Poços de Caldas é uma cidade pacífica, hospitaleira e por isto tanto Caldense quanto Vulcão precisam entender que um completa o outro. O nascimento do Vulcão veio para ajudar a Caldense. A partir do momento que você tem um adversário, é preciso trabalhar mais. A Caldense tem que trabalhar muito para estar acima do Vulcão assim, como o Vulcão tem que trabalhar muito para chegar aonde a Caldense chegou. A meu ver, um não vive mais sem o outro. Existem torcedores separados que já escolheram suas camisas. Agora é saber que a convivência precisa ser pacífica. Quanto mais o Vulcão crescer, mais a Caldense terá que crescer e, quanto mais a Caldense evoluir, mais o Vulcão terá que correr atrás. Tem que ter na cidade uma disputa sadia. Por isto Corinthians, Palmeiras, São Paulo e Santos são grandes. Um corre para não deixar o outro se distanciar e assim por diante.
Mantiqueira - Como é para você estar tanto tempo longe de Poços de Caldas?
Rubinho - Profissionalmente, me encontro na melhor fase da minha vida. Estou muito feliz. Desde que saí de Poços de Caldas consegui um espaço muito bom fora do Brasil como treinador de futsal adulto. Hoje, ainda faço projetos para o comitê olímpico do Qatar e recentemente assinei um contrato de dois anos com o maior clube do Kuwait. Claro que viver longe de minha cidade é muito ruim. Às vezes, ao mesmo tempo em que estou feliz bate uma saudade muito grande. O momento pessoal ainda está mais complicado já que meu pai está enfrentando problemas de saúde. O tempo que vai passando, vejo minha sobrinha crescendo de longe e minha filha que todo ano está em uma escola diferente, não tem uma sequência e isto acaba sendo ruim. Claro que para ela também existem benefício, ela fala inglês, espanhol, mas a falta de uma turma fixa acaba sendo um grande problema para ela que hoje não tem tempo de ficar um período grande estudando com os mesmos amigos. Acho que pode estar próximo o momento de voltar para Poços, ficar perto dos sobrinhos, dos familiares, dos amigos. Tudo tem que ser colocado na balança e já estou começando a estudar formas de ficar no Brasil. Quem sabe não aparece um grande projeto que me dê a chance de ajudar o esporte local. Tenho muita experiência e tenho certeza de que tudo que aprendi nestes anos fora do Brasil me dá suporte para desenvolver um bom trabalho em minha cidade. Voltar a Poços faz parte do meu projeto. Quero aproveitar o espaço e dizer que se alguém estiver interessado em desenvolver algum projeto bacana no futsal estou completamente à disposição. Meu e-mail é rubiomguerra@ yahoo.com.br ou pelo blog www.rubinhofutsal.blogspot.com. Se for um projeto sério estou disposto a voltar a trabalhar na cidade.
Mantiqueira - Você acompanha o esporte local mesmo à distância?
Rubinho - A distância não me impede de acompanhar o esporte de Poços de Caldas que é bastante dinâmico. A cidade tem várias escolinhas, times amadores um esporte especializado, campeonatos de veteranos, em alguns meus irmãos ainda jogam, temos dois times de futebol profissional. Estou por dentro de tudo que acontece na cidade. Leio o Mantiqueira pela internet e o noticiário esportivo é o meu preferido.
Mantiqueira - Mesmo à distância dá para avaliar o que acontece na cidade?
Rubinho - Dá sim. Eu acho que falta um pouco de direção para o atleta júnior, juvenil, infantil, enfim, o jovem que quer seguir adiante no futebol. É preciso disputar campeonatos que mais tarde o levem a um Campeonato Brasileiro, Mineiro e não apenas torneios que comecem e terminem em duas semanas. O garoto acaba perdendo a referência. Vejo muito, através do Mantiqueira, meninos que hoje jogam por uma escola e logo depois estão em outra. Antigamente não era assim. Acredito que as escolinhas e clubes da cidade precisavam dar uma referência melhor ao menino que quer seguir uma vida dentro do esporte. Li recentemente que a Caldense acabou com sua categoria de base, o Vulcão não tem categoria de base e não existe trabalho para dar suporte ao menino que teoricamente é o futuro do esporte brasileiro. Precisa-se de trabalho sério com os meninos para que no futuro tenhamos representantes de Poços de Caldas no cenário nacional e até mundial do nosso futebol.
Mantiqueira - Como é a organização neste sentido pelos países por onde você passou?
Rubinho - Eu sempre vou a países que estão começando, enfim, querendo realmente desenvolver o futebol. No meu caso, o futsal. Os trabalhos são bastante direcionados com campeonatos nacionais, estaduais, em que os campeões sempre vão para competições mais importantes, sempre seguindo as regras da Fifa que traça um caminho para que o clube chegue até o mundial de clubes. Assim foi quando passei pelo Canadá e pelo Qatar. No Brasil e em Poços não tenho visto isto. Por mais que Caldense e Vulcão não sonham com um Mundial. É possível sim, basta pensar grande. Qual seria o caminho para estes clubes? Primeiro o disputar bem o Campeonato Mineiro. A Taça Minas Gerais dá uma vaga para a Copa do Brasil, então vamos disputar a Taça Minas Gerais e buscar a vaga para a competição nacional. Se ganhar a Taça Minas Gerais, vamos para a Copa do Brasil e se ganhar a Copa do Brasil, vamos para a Libertadores que dá ao campeão vaga para o Mundial. Este é o caminho possível para qualquer time brasileiro, inclusive para Caldense e Vulcão. Falta vontade em crescer, pensam pequeno. Enquanto a gente ficar com estas coisas de torneiozinhos e não cuidar bem da base, mostrar para os meninos que este é o caminho, o nosso futebol não vai crescer nunca. Antes tínhamos uma mentalidade melhor. A própria Caldense já chegou a disputar campeonatos brasileiro, fez jogos memoráveis como aquele diante do Internacional de Porto Alegre que tinha Falcão e cia. Era uma vitrine. Naquela época todo mundo queria jogar na Caldense. O atleta via condições de chegar a um time profissional e enfrentar grandes craques do futebol brasileiro. Hoje, isto não acontece. Se a gente não mostrar isto para a molecada a coisa perde um pouco do sentido. No Qatar, existe a Liga Nacional e a seleção. O campeão e vice da Liga Nacional vão disputar a Copa do Golfo, se ficarem entre os quatro vão para a Copa da Ásia e entre os dois vão para o mundial de futsal interclubes. A mesma coisa acontece com a seleção que disputa o qualifyning do mundial na Ásia e se classificar vai para o Mundial. Aqui não acontece nada disto, preferem inventar brigas até mesmo com a imprensa, coisas pequenas. Muitos se envolvem com o esporte mais de olho na política. O esporte brasileiro foi para o lado de que tem que se fazer um vereador ou deputados. A Federação Mineira de Futsal perdeu o seu poder no Estado. Hoje, poucos clubes são filiados na Federação Mineira e grande parte da culpa disto é da Secretaria de Estado. Aqui mesmo no sul de Minas temos a EPTV que organiza uma competição e dá árbitros de graça dentro da jurisdição da Federação Mineira de Futsal. O governo teria que colocar uma lei que se é futsal é de responsabilidade da Federação Mineira de Futsal. Qualquer projeto, qualquer torneio teria que passar pela Federação Mineira. Hoje, qualquer um vai na Secretaria de Estado e faz a captação de verbas e organiza pequenos torneios, para agradar a este ou aquele, o fulano precisa de votos e assim sai verbas no futsal para tudo quanto é lado enquanto a Federação fica de lado. O caminho certo em se disputar e chegar num Brasileiro é pela Federação. Hoje, a Secretaria de Estado libera verbas para as secretarias dos municípios que investem da forma que bem entendem. Nos outros países, a coisa é feita da maneira correta e os resultados acabam sendo bastante satisfatórios. No Qatar, por exemplo, você não consegue fazer um torneio usando dinheiro do Governo, coisa que aqui acontece frequentemente. Aqui, temos muitas ligas, vemos os Jogos da Juventude, Jogos Colegiais, jogos disto, jogos daquilo e perdeu-se a referência com federações abandonadas, principalmente aquelas que cuidam do esporte especializado.
Mantiqueira - A que se deve o seu sucesso fora do Brasil?
Rubinho - Tive que trabalhar bastante o marketing pessoal. Cheguei aonde cheguei praticamente sozinho. Devo muito ao presidente da Federação Mineira de Futsal onde fiz meus cursos de futsal, trabalhei durante seis anos, aprendendo a fazer projetos, lidar com escolinhas. Agradeço ao presidente da entidade Marcos Madeira. Depois que aprendi tudo que precisava aprender fui para fora. O espaço no Brasil é muito difícil, muito centralizado. Minha passagem pelo Canadá acabou sendo muito boa, fiquei conhecido, comecei a ter destaque na mídia internacional, passei a ser reconhecido em países como México e Estados Unidos. Consegui mudar o futsal do Canadá, fazê-los entenderem sobre o esporte, sobre as regras da Fifa. Depois do trabalho feito fui embora para o Qatar onde existia uma organização um pouco melhor, com uma liga nacional. Ajudei a melhorar esta Liga, determinamos que nos campeonatos locais não poderiam ter muitos atletas de outros países para não atrapalhar a qualidade básica dos atletas locais. Isto foi ajudando a melhorar a qualidade do futsal de lá. Ao mesmo tempo eu era o treinador da seleção que passou a ocupar o 28º lugar no ranking da Ásia, hoje está em 19º. Então, tenho uma história de sucesso fora do Brasil conquistada com muito suor. Agora no Kuwait espero que consiga repetir o trabalho nas outras equipes.
Mantiqueira - Como você lidou com a diferença de culturas?
Rubinho - Tudo foi um pouco complicado, até mesmo as mudanças de clima. Deixei o Canadá com 30 graus negativos para ir para o Qatar com uma sensação técnica de 60 graus postivos e isto já foi um obstáculo. No mais, me adaptei bem. Conheci o islã, os mulçumanos, vi que muito do que se falam por aqui sobre eles não é verdade. Existe um respeito muito grande, as mulheres se cobrem toda com roupas pretas, os homens usam roupas brancas, mas tudo é questão de saber respeitar. Não pode chegar querendo impor coisas. Cada um respeitando suas origens. O Canadá é um país muito a frente do Brasil em termos de esportes. Eu digo culturalmente. Lá o esporte não nasce no clube e sim nas universidades, nas escolas, enquanto aqui, o surgimento vem em pequenas escolinhas, nas secretarias de esportes ou nos clubes. Acho que o Brasil deveria seguir o exemplo do Canadá e formar seus atletas nas escolas. Tenho certeza de que seríamos mais fortes ainda, principalmente individualmente. O Brasil é o país do futebol, mas acredito que está tudo errado na hora de formar o atleta. Se o atleta fosse formado nas escolas, quando ele fosse para um grande clube e fosse negociado, a escola formadora levaria parte do dinheiro da venda e não os empresários que hoje vivem e se enriquecem com altas negociações.
Mantiqueira - Fale um pouco da ligação de sua família como esporte
Rubinho - Minha família sempre esteve muito ligada com o esporte local. Meu irmão falecido, Luiz “Rubita”, jogou pela Caldense, meu pai foi jogador. Aliás, meu mai pai marcou o primeiro gol da Caldense no Cristiano Osório. Na noite em que o Cristiano Osório deu o terreno onde hoje é o clube social, houve um amistoso entre Caldense e Bahia que terminou empatado em 1x1 e o gol foi do meu pai. Isto hoje não consta no site da Caldense, não sei o porquê. Tem homenagem para todo mundo, mas nunca fizeram uma homenagem para meu pai. Tenho o registro desta partida contra o Bahia em casa e isto é história. Recentemente houve uma homenagem para o meu irmão no futsal da Caldense, mas esta homenagem partiu dos sócios que organizaram a competição. Meu irmão foi jogador da GM Costa por muitos anos e nunca foi homenageado pelo clube.
Mantiqueira - Aquele time da GM Costa foi o melhor da história de Poços?
Rubinho - Sem dúvida. Fomos campeões de tudo. Fomos campeões da EPTV, da Copa Record em São Paulo. Foi a melhor fase do futsal de Poços de Caldas. Ganhamos do Palmeiras em Poços por 8x1, em noite em que fiz cinco gols. Vencemos o Corinthians em Santos por 6x5. Jogávamos de igual para igual com todo mundo. Vinham alguns reforços de São Paulo, mas a maioria eram jogadores de Poços. Meu irmão Rubita montou um time de “amigos da rua”. O time tinha Marquinhos, o Ralf, Anderson, Rubinho, Conrado, Luiz da GM Costa. Infelizmente, esta fase nunca mais foi lembrada, nunca mais se falou daquele time. Foi através deste time de futsal que o Laércio tornou-se presidente da Caldense e a primeira coisa que ele fez foi acabar com o futsal da Caldense. Não estou aqui pedindo homenagem para ninguém, mas apagou-se a imagem do que meu irmão fez, do que meu pai fez. Só me pergunto o porquê. Hoje, se presta homenagem pelo time do Ailton Lira que não ganhou nada. Não entendo. Com aquele time de 1987, chegamos ao quadrangular final do Mineiro. Os quatro melhores naquele ano foram Caldense, Tupi, Cruzeiro e Atlético. Não se lembra mais disto. Ninguém fala desta época. Não teve homenagem para o Casca que faleceu lutando pela Caldense, para não deixar o time cair. Mesmo ganhando muito pouco, nós não deixamos a Caldense cair, sempre conseguimos manter o time na primeira divisão. Acho que precisava reconhecer melhor os vencedores e verdadeiros amantes deste querido clube. O time de 2002 que foi campeão e merecia ser homenageado, o Gustavinho, Marcus Vinícius, que está em Poços e ninguém lembra mais dele. Ele saiu do futsal com o meu irmão e com o Miro e que tantas alegrias deram para o time de futsal da Caldense. Acredito que ainda há tempo de se lembrar de grandes nomes do nosso esporte. Precisa ter memória e não esquecer quem realmente merece. Se o Ailton Lira saiu da Caldense e foi jogar no Santos, o Marcus Vinícius foi para o Cruzeiro, o Gustavinho foi campeão mineiro pelo Ipatinga. Quanto a atualidade, a Caldense precisa voltar às origens, dar oportunidades para jogadores da cidade e da região. Existem bons talentos que podem ser aproveitados. Bastar procurar e dar oportunidade. Não acho que o melhor é contratar das mãos de empresários que acabam enriquecendo e o clube fica a ver navios.

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