domingo, 28 de março de 2010

"Estão querendo aparecer às custas da Tatiele", desabafa técnico

Agnaldo Alexandre, técnico da campeã sul-americana dos 5.000m, Tatiele Roberta de Carvalho, concedeu entrevista ao Mantiqueira na tarde de ontem e fez um desabafo. Segundo ele, agora que Tatiele conquistou um título importante apareceram pessoas que nunca ajudaram a jovem e querem tirar proveito da situação. Indignado, ele não poupa nem o ex-treinador sr. Chico Corredor, que, segundo ele, se afastou da atleta e sequer a comprimentava na rua e agora chegou a desfilar ao lado dela no caminhão do Corpo de Bombeiros. O treinador também critica a falta de apoio da prefeitura de Poços de Caldas. Ele afirma que várias vezes foram impedidos de treinar nas praças esportivas da cidade e por esta razão os treinos da atleta tiveram que ser realizados em locais afastados, onde havia cobras e outros bichos.
Mantiqueira - Como você está vendo esta grande conquista da Tatiele?
Agnaldo Alexandre - Esta conquista foi muito importante. Conduzimos a carreira da Tatiele por etapas e graças a Deus e ao esforço dela conseguimos cumprir todas as metas traçadas. A Tatiele sempre demonstrou segurança e disciplina, vontade de crescer e vencer. Esta medalha, o título em Medellín, coroa o trabalho feito a duras penas ao longo deste tempo.
Mantiqueira - Como foi o início do seu trabalho com a Tatiele?
Agnaldo - Trouxe alguns atletas de outros Estados para treinar em Poços de Caldas e poder realizar aqui um trabalho de base. Fomos treinar no parque municipal e vi a Tatiele correndo. Ela e uma outra atleta quiseram conhecer a gente, saber de onde éramos e quem sabe inicar um intercâmbio. Conversamos bastante e vi muito potencial na Tatiele. Indaguei se ela era corredora de longa distância e ela disse que sim, mas fui muito sincero e falei que para uma corredora de longa distância ela estava muito pesada. Na época disse a ela que se houvesse interesse em iniciar um trabalho mais sério e profissional ela poderia me procurar e eu iria ajudar no que fosse possível. Passado pouco tempo ela me procurou dizendo que fazia um trabalho totalmente amador com o sr. Chico Corredor no parque municipal e queria mudar isso, quero crescer dentro do atletismo, evoluir. Ela chegou a dizer que estava estacionada no tempo.
Mantiqueira - Como foi esta mudança de treinador?
Agnaldo - Depois que a Tatiele demonstrou vontade de treinar comigo procuramos o sr. Chico para uma conversa que, infelizmente, não foi nada amigável, pois ele não aceitava a saída da Tatiele de sua equipe e falou algumas bobagens para ela, mas no fim das contas passei a ser o treinador dela e superamos todos estes problemas.
Mantiqueira - O que a gente pode esperar agora da Tatiele?
Agnaldo - Não estou acostumado a trabalhar com promessas de resultados e coisa e tal. Não quero repetir erros que foram cometidos com a Tatiele anos atrás quando falavam que ela estaria na São Silvestre ou nas Olimpíadas um dia, mas não tinha nenhum trabalho sendo feito para que esta promessa fosse cumprida. Eu, Agnaldo, não sou vendedor de ilusões e deixei isso claro para ela desde o início dos trabalhos. Meu trabalho é baseado em resultados e sou extremamente sério, extremamamente bravo e tento tirar do atleta o melhor que ele tem para me dar. Agora estamos focados em ir ao campeonato íbero-americano na Espanha e os treinamentos estão todos voltados para esta competição. Estamos tentando conseguir o índice para estar em Madri em junho. Este índice poderia ter sido conquistado na Colômbia mas a altitude foi um grande obstáculo. A Tatiele saiu de uma altitude de 1.300 metros em Poços de Caldas para quase 2 mil na Colômbia. Devido a este problemas descartamos correr pelo índice lá e sim buscar o resultado e o objetivo foi cumprido. Correr na altitude é tão desgastante para o atleta como é para o jogador de futebol. É muito mais difícil. Agora o trabalho está voltado para o índice visando este campeonato que é uma vitrine para o Pan-Americano e as Olimpíadas de 2012. A Tatiele tem condições de estar nestas competições e vamos atingir estas metas, não tenho dúvidas. Ela tem condições de ir a três olimpíadas, tem idade para isso e olhe lá se ela não pode ir a quatro jogos olímpicos, temos casos de atletas que conseguiram este feito. Para se ter um exemplo claro disto basta lembrar que a campeã da maratona dos Jogos Olímpicos de Pequim tinha 38 anos e é mãe de quatro filhos. A Tatiele hoje tem apenas 20 anos e pode sim repetir este feito.
Mantiqueira - Quem realmente está ao lado da Tatiele desde o início?
Alexandre - Sua pergunta é bastante pertinente pois agora apareceram muitos "parceiros". Até aqui a Tatiele teve um apoio quase que de forma cega do Lions. Quando ela começou com esta instituição, que é a Guarda Mirim, não era sequer uma atleta, esta é que é a grande verdade. Ela fazia os trabalhos, participava de competições mas muito de forma amadora. Ela treinava em média 30 km por semana antes de iniciar o trabalho comigo e depois que assumi sua preparação ela roda em média 150 a 160 km por semana, sendo que quando a gente está em períodos de base ela chega a mais de 200 km rodados por semana. Então, apoio mesmo foi da Guarda Mirim. Depois vieram apoios menores mas muito importantes como a ajuda do restaurante Tempero Caseiro, Doces Guigui, Suparts Auto Peças e de algumas pessoas que não quiseram aparecer por não serem tão ligadas ao esporte. Agora, existe toda uma logística para se treinar e com toda a sinceridade não estou aqui para falar mal de prefeitura, de Secretaria de Esportes. Pelo contrário, mas eles pouco ajudaram a Tatiele. Podem ter ajudado outras modalidades, senao a Secretaria não existiria. Qual a maior jóia de um setor de esportes senão o seu atleta? Sem o atleta não existe a Secretaria de Esportes. Quero deixar bem claro que a Tatiele não usufrui das dependências esportivas da cidade. Quando estávamos fazendo um trabalho no Ronaldão e a Tatiele estava na metade de uma sequência de tiros, que são repetições de 150 m na pista, uma pessoa, que prefiro não citar o nome, praticamente nos expulsou do local, dizendo que iria embora e nos convidou a sair do local naquele momento, independente se tínhamos ou não terminado os treinos. Não tem como ver issto como apoio logístico. Sempre fomos impedidos de usar as praças logísticas do município depois que ela passou a treinar comigo. Quero deixar bem claro que quando ela era atleta infantil e treinava com o sr. Chico, através dos projetos da Secretaria, podia utilizar os estádios de Poços, mas depois disso simplesmente foi impedida e teve que se virar para arrumar locais de treinamento.
Mantiqueira - Você tem alguma mágoa pessoal com alguém durante este período em que passou a treinar a Tatiele?
Alexandre - Não posso estabelecer nenhum tipo de críticas ao sr. Chico Corredor, não o conheço e nem a seu trabalho. Mas só depois que a Tatiele foi campeã sul-americana é que este cidadão veio me cumprimentar e voltou a falar com ela, depois do rompimento do trabalho que tinha com ele. Não sei o porquê deste rompimento pois desde criança aprendi que o esporte faz amigos. Quanto ao sr. Lelo, não tenho nada contra sua pessoa, que isso fique muito bem claro, mas não entendo porque as dependências do Ronaldão não são liberadas para a gente treinar. Hoje temos muito o que agradecer ao pessoal do Cepa, que nem conhecemos direito mas nos ajudou deixando que a Tatiele realize seus treinamentos lá. Tenho pena dela porque eu não a acompanho todos os dias por compromissos diversos e ela tem que treinar lá, que é um local cheio de cobras, além de outros bichos. Muitas vezes ela me ligava no meio do treinamento apavorada dizendo que as cobras estavam atrapalhando seu treinamento. Eu a mandava embora para a casa, afinal de contas as cobras estão em seu habitat e se sentirem incomodadas podem ficar perigosas. Se a Tatiele tivesse esta logística da Secretaria de Esportes não precisaria ir treinar nas estradas do Cepa, no meio do mato e correndo riscos a todo momento. Temos que descobrir estradas, lugares para treinar a duras penas.
Mantiqueira - Você acha que estão tirando proveito da vitória da Tatiele?
Alexandre - Nunca ninguém vai conseguir tirar proveito da vitória dela porque esta vitória é só dela. Se a partir de agora a prefeitura, através de sua Secretaria de Esportes ou quem quer que seja, quiser apoiar a Tatiele, nos ajudar, estamos com as portas escancaradas. Sempre há tempo para se começar um trabalho. O que não podemos deixar acontecer é que alguém queira fazer papel de vampiro em cima de Tatiele agora que ela ganhou um título importante. Mas se o sr. Lelo quiser ajudar será muito bem-vindo. Ele é uma pessoa por quem tenho todo o respeito e se tivermos que conversar, vamos conversar sim. Quando a Tatiele acordava às cinco horas da manhã nunca ninguém perguntou a ela se estava precisando de alguma coisa. Podemos te ajudar em alguma coisa? Não. Que fique bem claro que estou citando isso num período de dois anos e meio para cá. O que aconteceu antes disso não é da minha alçada, já que eu não conhecia a Tatiele e nem seu trabalho. Se fizeram alguma coisa antes parabéns a eles, mas depois que assumi a preparação dela não fizeram nada para ajudar esta atleta que hoje é campeã da América do Sul. Eu fui muito criticado. Disseram que eu estava me aproveitando da Tatiele, que eu iria acabar com a Tatiele de tanto treinar, que eu a estava levando para treinar no meio do mato com intenções de aproveitar dela sexualmente, o que será que ele faz com ela no mato? Tive que ouvir todo o tipo de acusação. Agradeço muito a estas pessoas que me criticaram pois são os mesmo que hoje estão batendo palmas para a gente. Hoje eles estão dando um pouco de valor a tudo aquilo que a gente fez. Ninguém viu ela se levantar às cinco horas da manhã, trabalhar o dia todo na Guarda Mirim, treinar novamente no período da tarde e ainda ter que me suportar pois sou chato e a cobro o tempo todo. Trabalhamos todo este tempo de forma artesanal enquanto as pessoas lá fora tinham toda uma estrutura a seu favor. Foram muitas as vezes que a Tatiele precisou de um suplemento e não tínhamos dinheiro para comprar. Nestes momentos aparecia o sr. Arnaldo Sato, da Guarda Mirim, e nos ajudava. Quando ela não tinha um tênis para treinar o sr. Luiz do Doces Guigui resolvia este problema. O Tempero Caseiro ajudava com as refeições e assim ela não precisava ir até sua casa no Jardim Ipê e voltar para o trabalho. Algumas pessoas colaboraram de forma muito intensa mas infelzimente esta ajuda não veio de quem mais precisávamos. Agradeço muito toda a festa que a Secretaria de Esportes fez na chegada da Tatiele a Poços depois da conquista, foi tudo muito louvável, agradeço ao prefeito municipal, à vice-prefeita, ao sr. Leo, enfim, a todos, mas gostaria muito que estas pessoas viessem conversar com a gente e que a Tatiele seja o ponto de partida para que outras modalidades sejam ajudadas. Não é todo dia que se tem em seu município uma atleta campeã sul-americana de atletismo. Isto é muito difícil de se conquistar, muito difícil formar um atleta deste nível. Eu acreditei no potencial dela, que trabalhou duro. Hoje estamos traçando novos rumos para a Tatiele. No atletismo não existe ilusão e não existe mágica e somente quem trabalha duro e com seriedade chega na frente. Não vamos vencer todos os dias, mas que bom que as derrotas também existem pois é nelas que a gente aprende a se levantar e buscar a vitória. Hoje ela é campeã sul-americana e amanhã quem sabe não seja campeã pan-americana? E se chegar a ganhar uma medalha olímpica? Aí vão pensar em fazer alguma coisa? Acho que a conversa tem que ser agora, esse é o momento do sr. Lelo, do prefeito municipal, dos órgãos competentes procurar a Tatiele e oferecer a ajuda que ela merece. Gostaria muito de conversar com eles, nem que fosse para a gente ouvir um não, mas seria bom se fôssemos procurados, pois afinal de contas algumas inverdades foram colocadas nos jornais. Estas inverdades me deixaram extremamente chateado. Em dois anos e meio ela nunca pode usar a pista, como o sr. Lelo disse à imprensa. Quando ofereceram limitaram o tempo para ela usar. Ela saía do trabalho às 16h e a pista era fechada às 17h. Não dava para terminar nem o aquecimento. Espero que desculpem minha sinceridade mas não tem cabimento depois de tudo, depois de dois anos e meio sem apoio, você aparecer e dizer parabéns, você venceu no esporte. Muitas vezes vi a Tatiele ir às lágrimas porque faltou a ela um bom dia ou uma boa tarde de seu ex-treinador. Posso afirmar com toda certeza que ela sim gosta e ama muito a ele. Foram oito anos de trabalho com ele e não oito dias. Foi estabelecida uma relação de carinho com ele e de uma hora para outra ele deu as costas para ela. A gente, como cristão, tem que perdoar mas as feridas demoram a cicatrizar. Depois que a Tatiele chega de um sul-americano aí ele aparece para dar um abraço. Foi ótimo este abraço para ela mas não precisava ter sido assim. Este abraço poderia ter sido antes e fez falta. Não para mim mas para ela, para sua cabeça. Não estamos falando de uma atleta veterana e sim de uma iniciante e que já é campeã sul-americana. O sr. Chico teve participação direta, definitiva na vida dela, que não deixou que ela partisse para o mundo da prostituição, das drogas, mas não poderia ter virado as costas para ela, não podia ser ausente neste dois anos e meio.
Mantiqueira - Você viu novas Tatieles em Poços de Caldas?
Alexandre - Poços tem muitos talentos e quero deixar claro que estou aberto a colaborar. Conheço muitas pessoas em Poços que são talentos fortes no atletismo, mas estas pessoas ao invés de procurar minha ajuda e tentar crescer dentro do esporte me criticam o tempo todo. Eu só tenho a dizer que as críticas fazem a gente crescer mas estão desperdiçando o próprio talento e podem sim ser atletas de alta performance. Estas pessoas poderiam abrir a mente e perceber que é possível transformar Poços de Caldas num polo esportivo. Poços tem hoje uma das melhores geografias do mundo. Quantos atletas de know how internacional vêm treinar em Poços e ninguém toma conhecimento? Aqui é fantástico para treinar, a começar pela altitude, pelas estradas, por tudo. Infelizmente não existe logística para ajudar os treinamentos. Nós que temos experiência não podemos colaborar, quem vai colaborar? Estamos abertos para tentar ajudar de alguma forma. Hoje graças ao bom Deus Poços de Caldas tem um grande espelho que é a Tatiele. Este trabalho pode ter continuidade nas escolas da cidade. Tanto eu quanto a Tatiele estamos inteiramente abertos para ir em cada escola mostrar para estas crianças que é possível realizar um sonho. Além do mais o que tira mais uma criança da rua do que o esporte? Quantas crianças mais terão que se drogar ou roubar até as pessoas se atentarem de que o esporte é a salvação, uma válvula de escape? Então, nos deem a chance de ajudar, abram as portas destas escolas para nós mostrarmos que isto é possível. Tenho alguns amigos excelentes dispostos a ajudar. O José Luiz Azevedo, da Fit Run, é uma pessoa fantástica, o André Oliveira, da Academia Performance, pessoas que nunca fecharam as portas para a gente, a Sandra da PM, seu esposo Fernandes, pessoas que podem colaborar com este trabalho. Hoje existe o trabalho feito no Ronaldão, o trabalho no parque com o sr. Chico, mas ainda é pouco, temos que fazer muito mais. Para finalizar, não vou aceitar pegarem carona na performance, nos resultados e na conquista da Tatiele pois para mim isto é uma covardia.

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