Mantiqueira - Você já teve uma dimensão deste título mundial?
Renato Rezende - Tem hora que nem acredito. Desde quando cruzei a linha de chegada o sentimento é inexplicável. Era um sonho que estava virando realidade. Eu sempre quis ser um w1 e hoje eu sou.
Mantiqueira - Que dificuldades você enfrentou para conseguir este título mundial?
Renato Rezende - Este Mundial começou dia 1º de julho quando eu fraturei o ombro e tive que ficar 21 dias imobilizado. Minha viagem estava marcada para o dia 24, e os dias em que fiquei parado prejudicaram na preparação e geraram muitas dúvidas. Fui para o Mundial sem saber de minhas reais condições. Não sabia bem se iria conseguir andar de bicicleta, já que meu médico disse que meu braço poderia sair do lugar a qualquer momento. Independentemente deste problema mantive o foco visando minha recuperação, fazendo treinos de perna na academia, andando de mountain bike e buscando enganar a contusão, enganar o corpo e mostrar que estava preparado. Além disso, tudo ainda tinha uma ansiedade, uma expectativa de chegar no Mundial sem saber se ia conseguir competir. Isto se transformou numa agonia. Foi um verdadeiro voo cego. Foi muito gratificante ao chegar à África do Sul e conseguir treinar bem. Fui o primeiro atleta a pular a Sequência Pró-rampas de 8, 10 até 12 m da entrada até a saída, igual motocross. É um salto muito grande e precisa pedalar muito para conseguir realizar a manobra. Precisa ter um nível técnico muito alto e eu consegui realizar esta prova, o que meu deu mais confiança.
Mantiqueira - Largar atrás e ultrapassar todos durante a prova é uma estratégia?
Renato Rezende - Não é estratégia. O problema é que não sou bom de largada e por isso preciso me sobressair na técnica. Senti muito o preparo físico. Eu estava me cansando mais facilmente, sentia dificuldades no trabalho de braço devido ao repouso recomendado pelo médico e ficou mais difícil. Eu não estava 100%. Este problema me prejudicou na Aro 20 onde é preciso fazer mais força para dominar a bicicleta e acabei não indo bem. Na Aro 24, prova que fui campeão, não é preciso tanto do preparo físico e por isso a técnica acaba falando mais alto. Largando atrás tem que ter um esforço muito maior se recuperar. Não gosto. Tenho um grande poder de reação e isso acaba sendo minha maior qualidade, mas preciso melhorar minha largada até fevereiro. Não posso continuar com esta desvantagem no início das provas. Não é sempre que dá para realizar as ultrapassagens. Vou treinar melhor as largadas, mas terei que fazer isso fora de Poços de Caldas. Aqui não temos um gate ainda e meus treinos deverão ser em Americana. Estamos com um projeto de reforma na pista do parque municipal e no local será feito um gate, até que isto não aconteça tenho que procurar alternativas de treinamento.
Mantiqueira - Quando você sentiu que dava para ser campeão?
Renato Rezende - Quando me classifiquei para a final. Num primeiro momento a felicidade era tanta que o resultado era o que menos importava. No entanto, quando subi no gate, meu pensamento mudou e falei para mim mesmo que iria ganhar, me foquei apenas na vitória. Entrei na pista para vencer e outro resultado deixou de ser interessante. Na segunda curva ultrapassei três competidores e foi naquele momento que eu praticamente garanti a vitória. Ao cruzar a linha de chegada nem acreditava no que tinha acontecido. Todos corriam para me abraçar e eu, numa grande euforia, tentava entender o que estava acontecendo. O momento mais emocionante foi no pódio quando tocou o hino nacional do Brasil. Não deu para conter as lágrimas. Só quem tem a experiência de subir num pódio e ouvir o hino do seu país, tocando por você, é que sabe o sentimento que se tem naquele momento. Inesquecível. Ser campeão do mundo, o melhor do planeta não tem como ser explicado. As dificuldades que enfrentei pouco antes do Mundial deram ainda um sabor especial a minha conquista.
Mantiqueira - O que você espera a partir de agora sendo um campeão mundial?
Renato Rezende - Sou o primeiro brasileiro a ganhar uma categoria elite num campeonato mundial e o segundo brasileiro a vencer um Mundial na categoria elite do ciclismo geral, em todas as categorias da modalidade. Acredito que este título trará benefícios não só para mim, mas para todo o BMX brasileiro. Temos condições de grandes evoluções neste esporte, as crianças vão se interessar ainda mais pelo esporte, a nova geração terá mais incentivo. Espero que este título abra muitas portas para o BMX.
Mantiqueira - Como ficou o caminho rumou a Londres 2012?
Renato Rezende - Ainda está muito difícil e tenho muito chão para percorrer. Estou indo para a Colômbia ainda este mês. Terei outros vários campeonatos e tenho que pontuar para tentar buscar uma vaga. É preciso que três pilotos estejam pontuando para que a equipe se classifique para os jogos olímpicos. Até agora só eu estou pontuando. Minha esperança é que os novos pilotos que estão vindo da categoria júnior consigam entrar na briga e me ajudem a conseguir a vaga. Como a pontuação é por nação, não basta apenas um piloto pontuando e sim os três que representariam o Brasil nas Olimpíadas. Sozinho não vou conseguir, a não ser que consiga vencer tudo até os Jogos Olímpicos e isso não vai acontecer. Não é todo dia que você está bem. Hoje, todos os melhores países têm três pilotos de destaque e por isso chegam fortes nas competições.
Mantiqueira - Não existe um outro meio de buscar esta classificação?
Renato Rezende - Vai ser realizado daqui a dois anos outro Mundial que dará seis vagas para as Olimpíadas de Londres. Se entre os finalistas já houver pilotos classificados para as olimpíadas e eu conseguir chegar às finais, também terei minha vaga garantida. Acaba sendo o caminho mais fácil de chegar aos jogos. Até lá vou estar num outro momento da carreira. Quero trabalhar mais minha parte física, aumentar minha massa muscular e acredito que tenho chances de conseguir meus objetivos.
Mantiqueira - Por que a grande mídia não deu a atenção que seu título mundial merece?
Renato Rezende - Infelizmente isto acontece com os esportes especializados. Nenhum tem a mesma divulgação que o futebol no Brasil. O BMX disputará em Londres apenas a sua segunda olimpíada e acredito que se a gente trouxer uma medalha haverá um interesse maior da grande mídia nacional. Esta visão precisa mudar para termos mais espaço e condições de buscar apoio com maior facilidade. Melhorando a mídia melhoram o patrocínio e as condições de trabalho.
Mantiqueira - E em Poços, como foi o reconhecimento durante esta semana?
Renato Rezende - Foi maravilhoso e gratificante saber que nosso trabalho está sendo reconhecido. As pessoas, na maioria das vezes desconhecidas, me param na rua, me parabenizam. É um orgulho para mim e fico até sem ter como agradecer ao carinho que venho recebendo. Muito obrigado a todos de Poços de Caldas pelo carinho. Chega a me emocionar.
Mantiqueira - E você, como está de apoio?
Renato Rezende - Estou com o apoio do Projeto Soma que me ajuda muito nos treinos de academia. O Projeto Soma ainda ajuda todos os meninos que treinam comigo e acaba sendo um grande parceiro. Recentemente fechei com a Oakley. Depois deste título tive alguns contatos e devo ter novidades em breve. A Cropi também é parceira e me fornece bicicleta e equipamentos.
Mantiqueira - Como está seu calendário para o resto da temporada?
Renato Rezende - Vou para a Colômbia ainda este mês, depois, Estados Unidos em setembro e França em outubro. Depois desta maratona quero descansar pelo menos uns 15 dias sem bicicleta, ficar tranquilo para iniciar minha pré-temporada. Quero chegar em 2011 bem mais preparado do que este ano. 2010 foi um ano muito bom para mim e não posso deixar de agradecer as pessoas que mais me incentivam. Desde o meu pai, Paulão Rezende, que dispensa comentários, está sempre ao meu lado, meus irmãos que treinam comigo e se espelham em mim. Minha mãe Sandra Sarmento que me apoia desde sempre, minha madrasta Paula, minha namorada Natânia, que me incentivou muito. Ela tem uma experiência por já ter sido atleta de ponta da seleção brasileira de ginástica rítmica e acaba sendo uma grande aliada. Tem ainda o apoio sempre importante da Secretaria Municipal de Esportes, da Confederação Brasileira de Ciclismo, do Fabio Politi, diretor de BMX da CBC, de todos os pilotos da elite, juniores que correm junto comigo, treinamos juntos e me dão muita força. Este título é da equipe, pois todos ajudaram da melhor forma possível.
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